Nos
últimos artigos revisamos brevemente algumas opções possíveis capazes de
interromper a atividade do receptor de fator de crescimento de fibroblasto do
tipo 3 (FGFR3) para bloquear os seus efeitos no condrócitos, a célula
responsável por criar o modelo em que o osso vai ser construído. Devido à
atividade excessiva do receptor (lembre-se, o FGFR3 é um freio natural que
controla o ritmo de crescimento ósseo), condrócitos multiplicam (proliferam)
menos do que o esperado, o que leva a um desenvolvimento ósseo prejudicado. O
resultado clínico é a acondroplasia. Além de bloquear a atividade do receptor,
há outras maneiras para impedir o FGFR3 de exercer suas ações. Por
exemplo, podemos também bloquear a sua produção.
No entanto, é importante compreender que FGFR3 não é um vilão. Este receptor é parte de um programa muito complexo que controla o crescimento ósseo. Não é aconselhável simplesmente abolir a sua produção, porque isso também poderia causar problemas. Então, como lidar com este desafio?
A
produção do FGFR3
Antes
de chegar à membrana celular, o FGFR3 deve ser expresso (produzido)
pelo condrócitos. A ciência está apenas começando
a desvendar a complexidade da maquinaria química que regula
a vida, o que inclui a compreensão de como os genes são lidos
e as proteínas são produzidas. Vamos falar um pouco
sobre isso.
O código genético humano está organizado em cromossomos, estruturas químicas feitas de proteínas e DNA que carregam todos os genes. Temos dois pares de 23 cromossomos, e cada um desses pares de cromossomos é herdado de nossos pais (um da mãe, outro do pai). Isto também significa que nós ganhamos cada um dos milhares de nossos genes em pares, da mesma forma. Este link irá levá-lo a uma animação que mostra como os cromossomos são organizados. O fim vem com um bônus, que mostra como as células se multiplicam (proliferam).
O código genético humano está organizado em cromossomos, estruturas químicas feitas de proteínas e DNA que carregam todos os genes. Temos dois pares de 23 cromossomos, e cada um desses pares de cromossomos é herdado de nossos pais (um da mãe, outro do pai). Isto também significa que nós ganhamos cada um dos milhares de nossos genes em pares, da mesma forma. Este link irá levá-lo a uma animação que mostra como os cromossomos são organizados. O fim vem com um bônus, que mostra como as células se multiplicam (proliferam).
Agora,
vamos relembrar a natureza da acondroplasia.
A acondroplasia é uma condição genética autossômica
dominante causada por uma mutação em apenas uma das
duas cópias do gene FGFR3 que todos nós possuimos em
nosso código genético. Em outras palavras, na acondroplasia, em
vez de duas cópias similares e normais do gene FGFR3, o
portador possui duas cópias diferentes, uma delas com a
composição normal e a outra com a troca de nucleotídeos (G1138A)
que causa esta condição. O gene alterado se sobressai em
relação ao gene normal (é dominante). A dominância
aqui é resultado da atividade excessiva da
proteína mutante, o que no jargão é chamado de ganho de função.
Quando os condrócitos recebem uma ordem específica (um sinal químico), iniciam o processo pelo qual os genes FGFR3 (os dois) serão lidos, permitindo a produção da proteína FGFR3 (a normal e a mutante). Veja esta animação, que mostra como um gene é lido e como as informações necessárias para a produção de uma proteína são obtidas e processadas.
Quando os condrócitos recebem uma ordem específica (um sinal químico), iniciam o processo pelo qual os genes FGFR3 (os dois) serão lidos, permitindo a produção da proteína FGFR3 (a normal e a mutante). Veja esta animação, que mostra como um gene é lido e como as informações necessárias para a produção de uma proteína são obtidas e processadas.
O
processo pelo qual um gene é lido é chamado de transcrição. Basicamente,
o gene feito de DNA será copiado (transcrito) na
forma de uma molécula feita de RNA, que é chamado de RNA
mensageiro (mRNA). O mRNA é dirigido para fora
do núcleo da célula e levado para o ribossomo no
citoplasma, onde vai ser lido, em um processo
chamado de tradução (em português translation tem sido
traduzido como translação). Pense no ribossomo, uma pequena organela
celular, como uma linha de montagem em uma fábrica. Ele
vai reconhecer a seqüência de nucleotídeos do mRNA e
montará uma cadeia de aminoácidos, que serão escolhidos de
acordo com essa seqüência. Veja este artigo que
é uma rica fonte de informações sobre aminoácidos e sobre
como eles são organizados para formar proteínas.
O processo todo é incrivelmente complexo e este texto e a animação que recomendei acima, embora se encaixem para explicá-lo, são simplificações. Vamos ver um pouco mais sobre o processo pós-transcrição, porque aqui existem algumas oportunidades onde podemos interromper a produção do FGFR3 mutante. Sem um super FGFR3, não teremos bloqueio do crescimento ósseo.
O processo todo é incrivelmente complexo e este texto e a animação que recomendei acima, embora se encaixem para explicá-lo, são simplificações. Vamos ver um pouco mais sobre o processo pós-transcrição, porque aqui existem algumas oportunidades onde podemos interromper a produção do FGFR3 mutante. Sem um super FGFR3, não teremos bloqueio do crescimento ósseo.
Entrando
no núcleo da célula
Estamos
longe de desligar um gene defeituoso diretamente no DNA. Por isso, não
falaremos em corrigir a mutação. Embora não possamos mudar o código genético
básico podemos, com certeza, mudar o que resulta desse código, apesar de que
isso não é uma tarefa fácil.
O
mundo do RNA
Vamos explorar um
tema complexo. Às vezes, o texto poderá parecer um
tanto árido. Caso isso pareça estar acontecendo, tente
visitar as referências que eu estou incluindo no
texto. Elas podem explicar de outra forma os processos que serão
explorados aqui, o que pode ajudar a facilitar a compreensão.
Durante
os últimos anos, tornou-se cada vez mais evidente que o RNA é
muito mais do que um "servo" do processamento
do código genético. Pesquisadores descobriram que o RNA tem
várias outras funções relevantes além de ser
um mensageiro do DNA, o que inclui a capacidade de
regular o
processo do mRNA para a translação em proteínas. Em
outras palavras, o RNA, em um dos vários formatos que pode
assumir, pode definir qual gene poderá produzir uma proteína e
qual não poderá, uma função muito poderosa.
Esta capacidade do RNA tem sido chamado de interferência de RNA (RNA interference) e vários tipos de moléculas de RNA podem interferir no caminho da produção de uma proteína. Antes de continuarmos, visite este link, patrocinado pela Nature (Jornal), que o levará a um vídeo em inglês muito ilustrativo (e técnico) que mostra a transcrição do DNA e também como é o mecanismo de interferência de RNA.
Esta capacidade do RNA tem sido chamado de interferência de RNA (RNA interference) e vários tipos de moléculas de RNA podem interferir no caminho da produção de uma proteína. Antes de continuarmos, visite este link, patrocinado pela Nature (Jornal), que o levará a um vídeo em inglês muito ilustrativo (e técnico) que mostra a transcrição do DNA e também como é o mecanismo de interferência de RNA.
Micro
RNAs
Se
você assistiu o vídeo, aprendeu sobre os micro RNAs, ou miRNAs (ou
miR n, onde n é um código numérico dado aos miRNAs). Os miRNAs são pequenos
pedaços de RNA que podem identificar uma seqüência de nucleotídeos de um mRNA,
se ligar a ele e parar o processo de translação do mRNA em uma cadeia de
aminoácidos (a futura proteína). Muitos (centenas) miRNAs já foram descobertos
e apresentam uma função de controle muito relevante na expressão da proteína
(produção). A falta de um miRNA específico pode levar a várias doenças, porque
se uma determinada proteína é liberada excessivamente as conseqüências podem
ser prejudiciais para a célula (câncer, por exemplo). Você pode aprender mais
sobre os miRNAs lendo este artigo na
Wikipedia.
Em
resumo, o modo de ação de um miRNA é o seguinte:
cada miRNA tem uma seqüência de nucleotídeos que é
complementar (que combina perfeitamente) com uma seqüência
no mRNA alvo. Quando um miRNA se liga a um mRNA,
o mensageiro não pode ser lido mais no ribossomo e é levado
à degradação e a proteína não é produzida. A
seqüência de nucleotídeos complementares é curta,
então uma propriedade do miRNAs é que, embora eles
sejam muito específicos para seus alvos,
há vários mRNAs que apresentam a mesma seqüência complementar e,
portanto, são alvos do mesmo miRNA.
Por exemplo, o miR 99a pode bloquear a leitura do mRNA FGFR3 que leva à produção da proteína FGFR3. Poderíamos usar o miR 99a para bloquear o FGFR3 na ACH? O problema aqui é que o miR 99a também bloqueia a expressão de outras proteínas, tais como a mTOR, que é uma enzima muito importante em processos celulares. Quando a doença é uma forma de câncer e ambos o FGFR3 e a mTOR estão influenciando o crescimento do tumor, pode ser interessante bloquear estas enzimas com um miRNA como o miR 99a. No entanto, qual seria o efeito desse tipo de ação em uma criança em crescimento? E quanto ao efeito nas outras enzimas além do FGFR3 bloqueadas por este miRNA controlador? Para saber mais sobre os testes feitos com o uso do miR 99a no FGFR3, visite o site da revista Oncogene para ler este artigo publicado em março de 2011.
Por exemplo, o miR 99a pode bloquear a leitura do mRNA FGFR3 que leva à produção da proteína FGFR3. Poderíamos usar o miR 99a para bloquear o FGFR3 na ACH? O problema aqui é que o miR 99a também bloqueia a expressão de outras proteínas, tais como a mTOR, que é uma enzima muito importante em processos celulares. Quando a doença é uma forma de câncer e ambos o FGFR3 e a mTOR estão influenciando o crescimento do tumor, pode ser interessante bloquear estas enzimas com um miRNA como o miR 99a. No entanto, qual seria o efeito desse tipo de ação em uma criança em crescimento? E quanto ao efeito nas outras enzimas além do FGFR3 bloqueadas por este miRNA controlador? Para saber mais sobre os testes feitos com o uso do miR 99a no FGFR3, visite o site da revista Oncogene para ler este artigo publicado em março de 2011.
Em
suma, nós começamos a aprender sobre a existência de
moléculas de RNA capazes de controlar a produção de
proteínas. A primeira classe destes agentes RNA é
representada pelos micro RNAs. Pelo menos um
deles, miR 99a, poderia ser teoricamente utilizado na acondroplasia para
controlar a produção de FGFR3. No entanto, a menos que haja um miRNA único
e exclusivo, capaz de identificar a região mutante
do mRNA transcrito do gene FGFR3 e se ligar
a ele, administrar miRNAs como o miR99a não
parece ser a melhor estratégia para tratar a acondroplasia. Os
micro RNAs podem não ser a melhor ferramenta aqui, mas
há outras.
Apenas começamos a explorar abordagens potenciais para parar ou reduzir a produção do FGFR3 para tratar as conseqüências da acondroplasia. O RNA tem mais a oferecer e vamos olhar para outra estratégia que pode ajudar a reduzir a parada de crescimento ósseo associada ao FGFR3 no próximo artigo.