Sunday, July 1, 2012

Desafios para o tratamento da acondroplasia: audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve

O que a famosa frase de Star Trek tem a ver com pesquisa de medicamentos?

Descobrir novos medicamentos não é fácil. É preciso um grande esforço de mentes brilhantes e grande investimento para fazer uma molécula se tornar um novo medicamento. O caminho que a nova droga potencial tem que percorrer, recentemente revisado ​​neste blog, é difícil.

Temos discutido os fatores principais para o desenvolvimento de drogas, tais como a elevada prevalência da condição clínica, o apelo social ou a gravidade da doença. Nos dois últimos artigos, fizemos também uma breve revisão dos principais desafios para uma droga antes de chegar à farmácia. No entanto, existem outros obstáculos neste caminho. Outra barreira para o desenvolvimento de drogas é o volume de conhecimento já disponível sobre a doença alvo. Vamos falar um pouco sobre esse assunto e vou tentar explicar o que isso tem com o título deste artigo.

O GPS leva você a qualquer lugar

Hoje, ao dirigir longe de casa, quantas pessoas desligariam o GPS e confiariam em um mapa de papel ou, pior ainda, apenas no instinto, para alcançar um ponto B partindo de um ponto A? Acho que uma minoria tentaria a "aventura" de explorar uma estrada desconhecida, atravessando cidades estranhas, sem o GPS ou um mapa. É humano buscar segurança e mapas e GPS são ferramentas que aumentam a confiança ou a sensação de segurança.

Este pensamento você pode extrapolar para qualquer aspecto da vida. Quantas pessoas apostariam suas economias no mercado de ações, que é muito imprevisível, ao invés de colocar as economias em um fundo de aposentadoria com regras claras sobre onde investir o dinheiro? Ou, examinando o meio da indústria farmacêutica, onde está envolvida a maior parte do investimento? Olhe as tendências e você vai descobrir que a principal pesquisa farmacêutica é nas áreas onde os mecanismos de doença já são bem conhecidos (Berggren, 2012). De diabetes e hipertensão ao câncer, as vias químicas estão razoavelmente conhecidas. Em outras palavras, a pesquisa é dirigida para áreas onde já existem bons mapas, onde há uma boa cobertura de GPS.

Por que isso acontece? É assim, porque é menos arriscado. É provável que uma molécula concebida para interferir em uma via metabólica conhecida tenha mais sucesso em termos de se tornar um medicamento que outra concebida para atuar em uma reação química menos conhecida. Isto também significa mais possibilidade de retorno de investimento com menos esforço. Dê uma olhada nas farmácias: quantos medicamentos diferentes das mesmas classes estão atualmente disponíveis para tratar a hipertensão (tente bloqueadores da enzima conversora de angiotensina ou betabloqueadores ou diuréticos neste link)?

Como o risco é maior, há relativamente poucas iniciativas em terras desconhecidas, ou por causa da raridade da doença ou apenas porque ninguém esteve lá antes.

Sem esforço, sem sucesso


Tenho pouca paciência com cientistas que diante de uma placa de madeira, olham para a parte mais fina e fazem um grande número de buracos onde a perfuração é fácil.
Albert Einstein
                                                          (in Bit-size Einstein. Mayer J & Holmes JP. St. Martin, Nova York. 1996. P 62. Tradução livre do autor).

Ir em direção ao desconhecido é difícil. Você, o cientista, o investigador, não sabe muito sobre ele, as pessoas em volta começam a questionar sua decisão, os investidores estarão mais cautelosos antes de lhe dar recursos para explorar o território. E então, se os primeiros resultados da sua pesquisa não parecem muito bons, as coisas vão se tornar ainda mais difíceis. Isso é algo comum entre os cientistas e já foi transformado em filme (você já assistiu Decisões extremas?).

Explorando o incomum

Em geral, as condições raras como a acondroplasia caem neste padrão humano de procurar os caminhos mais seguros e mais fáceis. A acondroplasia é rara, mas não é exatamente desconhecida. Pelo contrário, a maioria dos mecanismos que causam a redução do crescimento ósseo já é conhecida. Então, o que está impedindo que a comunidade científica apresente mais opções terapêuticas para a acondroplasia? Bem, o que impede que haja mais pesquisa em acondroplasia é exatamente a falta de recursos para colocar os investigadores no laboratório, trabalhando em questões objetivas, trabalhando em soluções.

O financiamento público não é suficiente: os governos vêm enfrentando aumento crescente dos gastos com saúde (1) e tendem a fazer mais subvenções diretas e a patrocinar mais o que são considerados problemas de saúde pública mais importantes (o que é justo, em termos de coletividade). A acondroplasia (e muitas outras condições raras) não está entre as principais metas em saúde pública. E, curiosamente, o financiamento público para a pesquisa básica nem sempre significa o desenvolvimento de uma nova droga no futuro. (2)

Ao mesmo tempo, como já mencionado acima, a pesquisa baseada na iniciativa privada está preocupada com os custos da descoberta de novas drogas e os riscos relacionados com o incomum. Para reduzir esses temidos riscos, várias grandes indústrias farmacêuticas têm assinado acordos com instituições acadêmicas ou empresas de biotecnologia de pequeno porte. Em uma forma simples de dizer, eles se destinam a ser uma espécie de parceria com compartilhamento de riscos para a descoberta de drogas. (3)

No entanto, num contexto de uma condição clínica rara, onde a população a ser tratada é composta por crianças, onde são considerados maiores os potenciais riscos, é sob a cobertura de iniciativas organizadas que novas estratégias podem ser desenvolvidas. Iniciativas de pais têm contribuído muito para a descoberta de novas estratégias para o tratamento de doenças raras. Um bom exemplo dessas iniciativas é dado pela Cystic Fibrosis Foundation.

Os pais precisam decidir se vão continuar esperando conformados com o que era incorrigível no passado, ou se vão se envolver diretamente nas próximas etapas da descoberta de novos medicamentos. Existem várias estratégias possíveis para o tratamento da acondroplasia esperando para serem exploradas. Elas são novas, como territórios inexplorados. Convido você a conhecer a Growing Stronger, uma iniciativa de pais para acelerar a pesquisa de soluções para melhorar a saúde das crianças afetadas pela acondroplasia.

Muitas das grandes conquistas da humanidade são consequências de alguém tomar a decisão de cruzar a fronteira. Vitórias são feitas de trabalho árduo e coragem para avançar além do conhecimento comum, para encontrar a solução escondida atrás da fórmula fácil, para atravessar o território mapeado, audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve.

Referências



1. Morris H. U.S. Health Care Costs More Than ‘Socialized’ European Medicine.  The New York Times, 28 Jun 2012.

2. Margaret E. Blume-Kohout. Does targeted, disease-specific public research funding influence pharmaceutical innovation? J Pol Anal Manag 2012; 31 (3): 641–60.

3. Mullard A. 2011 in reflection. Nat Rev Drug Discovery 2012; 11: 6-8. doi:10.1038/nrd3643.

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